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Novamente as transmissões televisivas...
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  Novamente as transmissões televisivas...
« em: 18 de Setembro de 2009, 10:01 »
O Benfica e os direitos televisivos

Por Bruno Prata

Num futebol português à beira da bancarrota, salta à vista a necessidade de os clubes rendibilizarem os direitos de transmissão televisiva, a exemplo do que vem acontecendo em toda a Europa. Nos diversos contratos negociados avulsa e separadamente, os 16 primodivisionários recebem da Olivedesportos um total de 50 milhões de euros/ano, num contrato que inclui os resumos de três minutos e a publicidade estática na primeira linha dos estádios. Mas a generalidade dos analistas financeiros que estudaram o assunto consideram que o seu valor real pode andar entre os 100 e 150 milhões de euros. E que, para atingir aqueles números, só há um caminho: negociar em conjunto e vender o produto em "pacotes". Mas há um óbice: o Benfica não concorda.

A posição benfiquista foi assumida pelo administrador da SAD Domingos Soares Oliveira em declarações ao PÚBLICO, há dois meses, e foi sustentada na certeza de que o clube da Luz defenderá melhor "os seus interesses" com uma negociação individual. Acrescentou que, por arrastamento, os outros clubes também retirarão vantagens da melhoria do contrato do Benfica, que, na sua opinião, poderá atingir os 40 milhões de euros. O Benfica recebe actualmente cerca de nove milhões, com as alcavalas resultantes das negociações, com Joaquim Oliveira, que se seguiram ao contrato rasgado por Vale e Azevedo. O FC Porto fica-se pelos 8,5 milhões e o Sporting pelos 7,5 milhões. Os clubes de média dimensão recebem 3,5 milhões de euros e os restantes 1,5 milhões.
Para chegar aos 40 milhões de euros, Domingos de Oliveira baseia-se no facto de os clubes das principais ligas europeias garantirem cerca de metade das suas receitas através dos contratos televisivos. Ora, como o Benfica tem receitas globais superiores a 80 milhões de euros...

É um princípio com certa lógica, mas também algo irrealista e nada solidário. O mais provável é que o gestor esteja a colocar a fasquia muito alta para condicionar as negociações que irão decorrer durante o actual mandato de Luís Filipe Vieira.

O actual contrato benfiquista termina em 2013, tal como o do Sporting, enquanto o do
FC Porto dura mais uma época. Provavelmente, qualquer deles já ficaria satisfeito se conseguisse duplicar as verbas actuais. Porque sabem dos constrangimentos e das limitações do nosso mercado.
Nesse sentido, e partindo do princípio de que seria viável duplicar o "bolo", vale a pena meditar neste exercício hipotético. Garantidos os 100 milhões através de um "leilão" de diversos "pacotes" (directos nacionais e internacionais, diferidos, resumos, Internet, telemóveis, satélite, cabo, pay-TV, publicidade, etc.), 50 por cento daquele valor era dividido pelos 16 clubes. Cada um teria imediatamente garantidos 6,25 milhões de euros. Os restantes 50 milhões poderiam ser para dividir pelos três "grandes", que assim encaixariam mais 16 milhões cada um, num total de 22,2 milhões. Tanto a distribuição desta como a da primeira fatia poderia levar ainda em conta variáveis relacionadas com a classificação, as audiências e o número de adeptos, o que acabaria por beneficiar o Benfica. Todos ganhariam sem que se perdesse o espírito solidário que iria contribuir para potenciar a competição, tornando-a mais forte e saudável.

O Benfica acha, com razão, que tem mais adeptos e mais audiência. E que, por isso, terá vantagens em negociar sozinho. Mas devia olhar para o que se passou na Escócia (o Celtic e o Rangers representam 80 por cento das receitas totais) e na Grécia, países com população menor ou idêntica a Portugal e onde a venda conjunta dos direitos televisivos foi um sucesso.

Nas big five, os direitos de TV aumentaram 17 por cento em 2007/08, um crescimento de 521 milhões de euros, o que permitiu atingir um total de 3,7 milhões de euros. A venda colectiva dos direitos de TV é uma tendência já confirmada na Inglaterra, Alemanha, Itália, França, Escócia, Grécia, Bélgica e Polónia, sendo Portugal e Espanha as únicas excepções. Permitiu, por exemplo, que as receitas inglesas subissem 60 por cento e se fixassem nos 913 milhões de euros em 2009-10. Em resultado da mesma aposta, a Ligue 1 francesa inflacionou as receitas da TV em 43 por cento, atingindo os 566 milhões de euros.

A televisão é mesmo a chave do sucesso da liga inglesa. Em 1999/00, o "bolo" era de 377 milhões, 27 por cento menos do que o do Cálcio e apenas mais 10 por cento do que conseguiu a liga francesa. Agora, gera mais 313 milhões de euros do que a Série A italiana. Ou seja, mais 36 por cento, isto apesar de o Cálcio também ter aumentado 215 milhões de euros (33 por cento) em 2007-08.

Em França, o Canal Plus e a empresa de telecomunicações Orange pagam, em conjunto, 668 milhões de euros por cada uma das épocas (até 2012) dos direitos televisivos da Ligue 1. Estas receitas geridas pela liga francesa permitem que, na presente época, os clubes da Ligue 1 tenham um encaixe mínimo de 12,16 milhões de euros só em direitos de TV. Em 2008/09, a negociação conjunta já tinha permitido que o Marselha recebesse 46,5 milhões de euros, seguido do Lyon (43,5 milhões) e do Bordéus (41,4 milhões).

Tanto a liga inglesa como a francesa procuram proporcionar uma justa distribuição das verbas, o que não impede o Manchester United de encaixar 116 milhões de euros e o Chelsea 98 milhões. Na Premier League, 56 por cento do "bolo" é dividido em partes iguais, garantindo imediatamente 25,5 milhões de euros a cada um. Depois, 22 por cento é distribuído em função do mérito desportivo, ficando uma fatia igual para ser atribuída em resultado da audiência e dos jogos transmitidos. Em França, só mudam as percentagens: 50, 30 e 20 por cento, respectivamente. Em qualquer dos países, os direitos não podem ser vendidos a uma única entidade, para evitar o monopólio e fomentar a concorrência. Na Alemanha, o "bolo" vale 476 milhões de euros (o Bayern recebe 50 milhões).

Na Escócia (com metade da nossa população e com um mercado TV pouco competitivo), a negociação conjunta sofreu um forte revés após a falência da operadora irlandesa Satenta, que tinha comprado os direitos para os próximos cinco anos da Scottish Premier League por 145 milhões de euros. O "pacote" acabou por ser adquirido pelas operadoras ESPN e Sky, que apenas aceitaram pagar 75 milhões. Mesmo assim, os clubes escoceses têm previsto encaixar um total de 157 milhões de euros até 2014, à média de 20 milhões de euros por época.

A Liga grega também optou pela negociação conjunta, garantindo um "bolo" de 72 milhões de euros/época, de 2009 até 2012. Este valor representa um aumento de 55 por cento.
É uma tendência geral e a própria Comunidade Europeia já estuda legislação que regulamente a negociação colectiva dos clubes - nos círculos comunitários, especula-se, de resto, sobre a possibilidade de o Real Madrid (que encaixa 136 milhões de euros em Espanha) estar a fazer lobby para inviabilizar qualquer decisão nesse sentido.

Mas há sempre a possibilidade de o Estado intervir, como aconteceu em Itália, onde um decreto governamental impôs a negociação conjunta. Os clubes da Série A foram obrigados a rescindir os contratos em vigor. Os mais renitentes foram convencidos com a ameaça de que, caso contrário, os valores dos seus contratos seriam integrados no "bolo" a distribuir pela liga.

Actualmente, em Itália, a Juventus, o Inter e o Milan recebem cerca de 100 milhões cada um. Com a centralização e os novos contratos, que irão vigorar durante seis épocas a partir de 2010/11, vão receber menos 15 a 20 milhões. Mas isso justifica-se numa prova financeira e desportivamente equilibrada e onde o Nápoles até é o clube com mais adeptos. Os direitos nacionais e internacionais da Série A nas duas próximas épocas vão ser vendidos em seis "pacotes". Com isso, irá obter-se um "bolo" mínimo de 895,8 milhões de euros só para a época 2010/11, valor que subirá para 927 milhões no Cálcio seguinte.

Em Portugal, é difícil acreditar que o Governo (seja ele qual for) tenha coragem para intervir nesta matéria. Até por isso, é preciso que o Benfica não cometa o pecado da gula e perceba que também pode sair a ganhar por ser solidário.


in Público


O tema já se tinha sido introduzido aqui. E foi também aflorado (ainda que de forma superficial) pelo sociólogo João Nuno Coelho em entrevista publicada aqui.

É importante que esta ideia já tenha chegado a um jornalista ... do sistema, como Bruno Prata. Realço sobretudo a passagem que, com o exemplo italiano, afasta o cenário de inevitabilidade do actual estado de coisas...
 

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