"Parece mentira, mas há quem olhe de lado para Vandinho, o capitão do Sporting de Braga. O brasileiro tem uma relação "muito, muito próxima" com o presidente António Salvador e no balneário por vezes desconfia-se do verdadeiro poder deste médio de 32 anos, forte no pulmão que leva para dentro do campo, poderoso na inteligência que usa fora dele. A questão é que Vandinho joga de forma exemplar, vive e sente a equipa, transpira o Braga por todo o lado e até é capaz de chorar quando, após uma vitória especial como foi aquela com o Sevilha, sente estar perante a conquista mais importante da carreira. O braço-direito do presidente no balneário até pode ser invejado, mas no fim impõe-se com naturalidade - "ajuda ao equilíbrio de um balneário que tinha tudo para ser problemático", explicam ao i.
Essa é um das surpresas do Sporting de Braga: a existência de um grupo esforçado e unido quando, à primeira vista, podia acabar estilhaçado pelas diferentes nacionalidades ou pelos egos dos dispensados e acomodados que lá foram parar. "Podem pensar que não, mas aquilo é como uma equipa grande e como em todas as equipas existem feitios complicados. Os brasileiros são uns dez ou 15, há jogadores do Uruguai e da Argentina... agora até da Nigéria. Mas tudo funciona e o Vandinho ajuda." O brasileiro que Carlos Brito foi buscar para o Rio Ave, em 2002/03, "põe toda a gente à vontade". Nem sequer tem aquela necessidade de formar o seu grupo de beija-mão, o que é estranho, porque à primeira vista teria facilidade em reunir à sua volta os brasileiros. "Aliás, entre eles há até quem desconfie do Vandinho. Mas depois respeitam-no pela forma como se impõe, porque não precisa de jogos desse tipo", explicam.
O BRAÇO Meias para baixo, cara de quem vem do Interior do Brasil (nasceu em Cuiabá, Mato Grosso), só assim se repara no atleta. O resto é discrição. Vandinho é dos que mais ganham em Braga mas o seu Audi é só mais um carro entre os bólides que se estacionam à volta do estádio. Do que ele gosta é de ser competitivo. Na época passada, Domingos Paciência retirou-lhe a braçadeira de capitão e toda a gente ficou de boca aberta, ninguém acreditava que pudesse haver por ali algum caso capaz de abrir um fosso entre treinador e jogador. Mais tarde percebeu-se: Vandinho tinha uma fractura num braço; fez questão de não falhar nenhum jogo, pediu aos médicos que lhe ligassem o punho, usou camisola de manga comprida e luvas para esconder o curativo e ficou sem braçadeira para que, no início das partidas, não tivesse de cumprimentar o árbitro. Assim não corria o risco de lhe levantarem problemas por causa do gesso à volta do braço. "Ele quer jogar sempre, não quebra, mas todos lhe reconhecem qualidade. Talvez não se repare mas quem joga ao seu lado define-o como um dos melhores trincos do futebol português", continuam.
O pior que podem fazer a Vandinho é privá-lo de jogar. Na época passada, quando foi castigado, na sequência de incidentes num jogo contra o Benfica, o futebolista entrou em desmotivação. Afinal, ficou três meses fora da equipa e ficou impedido de ajudar o Sporting Braga na luta contra o Benfica, naquela que seria a melhor época de sempre dos minhotos (2.o lugar). Mas afinal, talvez o melhor ainda esteja para vir. O apuramento para a fase de grupos da Liga dos Campeões constituiu a melhor oportunidade que lhe surge na carreira, as boas memórias europeias podem não resumir-se às participações na Taça UEFA e na Liga Europa. Finalmente, Vandinho sente-se no topo e é isso que lhe vem à cabeça. "É a concretização de um sonho de menino, jogar a Champions marca a diferença na carreira de um jogador", diz o próprio jogador, na ressaca da eliminatória com o Sevilha.
A CARA Jesualdo Ferreira, Jorge Jesus, Domingos Paciência... Vandinho atravessou todo este percurso de estabilização do Sporting de Braga entre os grandes do futebol português, iniciado com a presidência de António Salvador. Tornou- -se capitão e quando Domingos pegou na equipa, no início da época passada, não havia qualquer razão para alterar a ordem instituída. Salvador tem procurado contratar jogadores que rendam dinheiro em futuras transferências mas ao mesmo tempo consegue manter uma estrutura mínima, capaz de evitar a destruição do projecto iniciado. Vandinho é a principal cara dessa estrutura. Exceptuando os problemas entre 2006 e 2008, espelhados nas sucessivas trocas de treinador (Carvalhal, Rogério Gonçalves, Jorge Costa e Manuel Machado), o Sporting de Braga cresceu em função da qualidade dos seus plantéis, hoje com outros nomes importantes como Moisés e Rodríguez (a intocável dupla de centrais), ou Luís Aguiar, Alan, Matheus e Paulo César (as grandes referências ofensivas). E com Vandinho sempre presente. Juntem-se as contratações acertadas (Lima, Salino e Sílvio são os últimos exemplos) e o quarto grande é um clube capaz de aceder à Liga dos Campeões. Resta acrescentar o nome do treinador, Domingos Paciência, que depois de um arranque tímido, chegou a um nível tal (segundo lugar no campeonato, acesso à prova milionária após eliminar Celtic e Sevilha) que as comparações com Jorge Jesus começam a ser despropositadas. "Domingos tem o seu cunho na equipa. Por exemplo, é ele o responsável por esta aposta de Paulo César como extremo-esquerdo. Além disso, é quase um obcecado pelo trabalho defensivo. Exceptuando um jogo louco como o de Sevilha, em que os erros individuais se notaram, o Braga raramente sofre golos porque o Domingos trabalha ao detalhe a junção entre a linha defensiva e do meio-campo. Ali não há espaço para ninguém jogar."
O BOLSO Será assim que o Minho entra na rota da Liga dos Campeões. Com reforços? O que fazer com os 11,4 milhões de euros que aí vêm da UEFA? Parece normal a tentação de ir ao mercado mas provavelmente não é isso que vai acontecer. António Salvador defende que tem a equipa construída, espera vê-la crescer e não deverá ceder à tentação da riqueza. Ontem, em Espanha, especulava-se uma possível contratação de Hugo Viana, mas até para um futebolista com esse nome (e mais ou menos solto pelo Valência) a porta parece fechada. "