OS DESAFIOS DE ABELPROMOÇÃO Treinador vai enfrentar vários obstáculos nesta primeira aventura na I Liga. O mais importante: “ultrapassar a desconfiança” por ser um homem da casa“Nesta altura, o maior desafio que ele tem pela frente é fazer com que as pessoas acreditem nas suas capacidades”
“O Abel vai estar constantemente a ser avaliado por toda a gente. Até vai ser avaliado pela forma como caminha...”
Armando Evangelista
Treinador de futebol Armando Evangelista teve, em Guimarães, o mesmo percurso de Abel Ferreira em Braga, detalhando agora os desafios que o novo treinador vai ter para ultrapassar o “estigma de homem da casa”
Depois de mais de três anos a formar jogadores para as equipas principais de Sporting e Braga, Abel Ferreira vai arrancar, no próximo domingo, uma nova aventura, num ambiente que ainda só conhece dos tempos em que foi jogador: a I Liga. O desafio está lançado, mas O JOGO foi tentar perceber quais são os obstáculos que se colocam a um “homem da casa” – como lhe chamou António Salvador – quando é chamado a assumir o topo da pirâmide de treinadores de um clube de futebol. Abel Ferreira chegou lá por “mérito pessoal”, pelo “excelente trabalho desenvolvido nos últimos anos”, mas agora vai iniciar uma nova etapa na carreira, “a mais difícil de todas”. A opinião é de Armando Evangelista, que passou exatamente pelo mesmo processo no rival de Guimarães. “Esta passagem da formação para a equipa principal não é fácil. É um processo muito complicado... Quando se cresce dentro de um clube, e depois se chega onde está o Abel, há sempre uma certa desconfiança relativamente às reais capacidades como treinador. É como o estigma que sofrem, muitas vezes, os jogadores formados no clube, que têm de provar muito mais do que os jogadores contratados. Ele, nesta fase, vai estar constantemente a ser avaliado por todos, estrutura, jogadores e adeptos. Até vai ser avaliado pela forma como caminha...”, afirmou Evangelista, tendo por base a sua “experiência” em Guimarães. “O trabalho que ele fez nos últimos anos não deixa margem para dúvidas: as qualidades como treinador estão lá. Agora, o maior desafio que ele tem pela frente nesta primei rafas e,queéa mais importante, é fazer com que as pessoas acreditem nele. Vai precisar de uma pontinha de sorte para que os resultados surjam logo no início, até porque, a este nível, não existem projetos, há apenas o ganhar e o perder, o ficar e o ir embora”, acrescentou.
O atual contexto difere, no entanto, num pequeno pormenor, na comparação com aquilo que Armando Evangelista encontrou em Guimarães: Abel foi contratado antes do final da época e, mesmo “sem grandes objetivos coletivos”, terá de orientar a equipa em quatro jogos. “Mais a ganhar ou a perder? Boa pergunta. Depende da forma como as pessoas encararem este final de época. Se o clube o chamou nesta fase para lhe dar alguma experiência de I Liga, mas sem olhar aos resultados, então acho bem. No entanto, se assim não for, e se os resultados nestes quatro jogos não forem bons – recordar que ele não vai ter tempo para moldar a equipa à sua imagem –, o Abel pode sair fragilizado para o arranque da próxima época. No fundo, ele vai estar em constante avaliação. Ele tem, sobretudo, de conquistar o seu espaço e de ganhar estatuto entre a estrutura, jogadores e adeptos e isso só se consegue com bons resultados”, finalizou.
AS HISTÓRIAS DE ABELA história dos limões e o “atraímos o que pensamos”Pedro Monteiro, atualmente emprestado ao Paços, trabalhou mais de um ano com Abel na equipa B do Braga. O defesa falou de um “grande treinador”, mas sobretudo de “um grande homem”. “Ele é muito amigo dos jogadores e estava sempre a dar-me conselhos profissionais e pessoais. Foi um treinador muito importante para mim”, recordou Pedro Monteiro, que destaca a parte motivacional do sucessor de Jorge Simão. “Ele estava sempre a dizer ‘atraímos o que pensamos’ e contou-me algumas vezes a história dos limões. Um dia, à noite, ele estava a ir para casa e apetecia-lhe sumo de limão. O problema é que já estava tudo fechado e ele não tinha limões em casa. Então, contava ele, de repente passou por uma zona com muitos limões espalhados na estrada. Ele dizia isto para explicar que temos de pensar positivo, porque ‘atraímos o que pensamos’. Essa é a frase dele, estava sempre a repeti-la”, recordou.
Mudar de trajeto e de... pastelaria para evoluirNuno Valente guarda excelentes recordações dos seis meses que trabalhou com Abel, ao ponto de, ainda hoje, seguir um dos muitos conselhos que o treinador lhe deu. “Um dia, ele veio ter comigo e perguntou-me o que esperava do futuro. Disse-lhe que queria chegar à equipa principal do Braga, apesar de, naquela altura, isso me parecer difícil. O Abel lembrou-me que, para lá chegar, tinha de começar a fazer coisas diferentes. Pensei que era em campo, mas não. Ele disse-me: ‘Se vens sempre pela mesma rua para o treino, amanhã escolhe outra, nem que o trajeto seja mais longo; se vais sempre à mesma pastelaria, da próxima vez vai a outra; se costumas chegar ao treino às 8h30, começa a chegar às 8h15. Muda a tua rotina e assim estás mais perto de evoluir também na tua profissão’. Essas palavras marcaram-me e, ainda hoje, quando as coisas não estão a correr bem, lembro-me dele e tento mudar os meus hábitos”, contou.
Ambição e a capacidade de mexer com a cabeçaFábio Martins, uma das principais revelações desta época no campeonato português, também recorda bons momentos de quando foi treinado por Abel Ferreira. “Foi a escolha certa. O Abel é um treinador muito ambicioso e capaz de criar uma grande empatia com os jogadores. Tenho a certeza de que vai ser bem sucedido. Entra num contexto difícil, mas vai conseguir agitar o balneário e pôr aquilo a andar”, contou o extremo. “Ele consegue mexer com a cabeça dos jogadores, é muito bom no plano psicológico. Também gostei muito do trabalho de campo que ele fazia. Dá liberdade aos jogadores, dentro de um contexto de responsabilidade coletiva”, recordou, antes de falar sobre as diferenças entre a equipa A ea B. “É evidente que a exigência vai aumentar, mas ele está preparado para este desafio, até pelo passado que teve como jogador”, rematou.
JOGO CARLOS MARTINHO NOS BÊSAmanhã, a equipa B vai deslocar-se a Guimarães, para o jogo da 39.ª jornada da II Liga, com Carlos Martinho no comando técnico. O treinador adjunto de Abel Ferreira na formação principal vai substituir provisoriamente o seu chefe de equipa no dérbi minhoto deste sábado (16h00). Antes disso, pela manhã, Martinho ainda estará com Abel no treino da equipa principal.
PROMOVIDO DIDI CHAMADO AO TREINODidi, da equipa B, foi ontem promovido por Abel Ferreira ao treino do plantel principal. O médio tem sido um dos jogadores mais utilizados pelo treinador na II Liga ao longo dos últimos anos, justificando agora uma chamada à primeira equipa. Marafona está recuperado, enquanto Xadas e Gamboa estiveram de regresso depois de terem participado no estágio da Seleção de sub-21.
Peixoto lança ataque a SalvadorOpositor de António Salvador não compreende a troca de treinador a quatro jornadas do final da época e critica duração do contrato oferecido a Abel (2020) quando falta apenas um mês para as eleiçõesAntónio Pedro Peixoto comentou a recente saída de Jorge Simão do comando técnico do Braga e a consequente promoção de Abel Ferreira, que será“o terceiro treinador” desta época, exigindo ainda“o assumir de responsabilidades” de António Salvador, atual presidente, pelo “fracasso”. “Não podemos deixar de referir que a responsabilidade por todas estas alterações (aparentemente muito pouco ponderadas), que acabaram por redundar numa época abaixo das expectativas, tem de ter um rosto que a deve assumir. Um líder deve reconhecer, deforma clara, a responsabilidade no fracasso, da mesma forma que colhe os louros quando alcança alguma meta”, afirmou o candidato à presidência do clube, que falou ainda da chegada de Abel. “Gostava de ouvir a versão de Jorge Simão sobre a saída... Mas, a partir de agora, Abel é o melhor treinador do mundo, simplesmente porque é o do Braga. Da minha lista não se vai ouvi ruma única palavra que possa desestabilizar o grupo de trabalho”, prosseguiu António Pedro Peixoto, que criticou, no entanto, o timing da chegada de Abel .“Não me pareceu ma boa altura para trocar de treinador. Estamos a quatro jogos do final do campeonato... E também não me parece correto, a cerca de um mês das eleições, vincular um treinador ao clube por tantos anos”, rematou.
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